Burrice mata, ou aleja.
Durante muitos anos evitei comentar a burrice que cometi em cima de uma Lambretta, e que acabou por encerrar minha vida motociclística naquela época.
Agora que retornei à vida em cima de motocicleta, com extremo cuidado, me permito contar o acidente que sofri, graças única e exclusivamente à minha burrice.
A história começa com um furto. Lá pelos idos de 1978, tocando o estúdio de comunicação visual und (hoje tem um nome mais “chique”: design gráfico) que havia criado com o Lelé Chamma em 1977, um belo dia, na hora do almoço um gatuno entra no escritório, que ficava na R. Felipe de Alcaçova, na Vila Madalena, e leva nossa jóia da coroa, uma máquina de escrever elétrica IBM, “de bolinha”.
Ao saber do sumiço da peça, decidi que precisávamos de um muro alto, pois a casa era aberta para a rua, com murinho baixo.
Saí na minha Lambretta cor de laranja atrás de um depósito de material de construção, para encomendar areia, cimento, ferro e tijolo.
Quando desci a íngreme ladeira da R. Purpurina, entre a Fradique e a Mourato, encontrei um caminhão que subia e cuja carga de ferros de construção havia “escorrido” para o chão. O motorista e o ajudante estavam ali sem saber o que fazer, coçando a cabeça. Parei e perguntei:
– Tá sobrando ferro aí
– Por que, tá precisando quanto?
– Duas barras. (cada uma tem cerca de seis metros de comprimento)
– Pode pegar.
Embalado pela fantástica economia que eu proporcionaria à obra do muro, peguei duas barras no chão, dobrei-as ao meio, passei pelo estepe da Lambretta, amarrei com elástico, e saí arrastando uma espécie de rabo de andorinha com três metros de cada lado da Lambretta.
Subi a Purpurina em primeira marcha, virei à direita na Fradique, tudo ia bem, o ruído dos ferros arrastando no asfalto, me animei, coloquei segunda marcha, já estava no meio do quarteirão, ganhando velocidade na descida, quando um brutal tranco me lançou ao chão.
Deitado no asfalto, tonto, arranhado, esfolado, com enorme corte no pé, roupas e sapato rasgado, sem óculos e sem relógio, fui socorrido por “populares”, que gentilmente recolheram meus pertences espalhados e me ajudaram a levantar.
Aí entendi o tamanho da minha burrice, o lado direito daquele apêndice metálico que arrastava havia sido “mordido” pelo pneu de um carro estacionado, brecou a Lambretta que simplesmente me ejetou.
O saldo da brincadeira: Um pé mal costurado no pronto socorro da esquina, que depois inflamou e tive que ir a um cirurgião plástico que abriu tudo de novo, uma Lambretta destruída, a obra do muro adiada e uma lição aprendida:
Burrice mata.