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aniversário com amor

Uma menina que conheci pequena, hoje mulher feita, enviou este texto para o irmão, que conheci menor ainda, como presente de aniversário pelos seus 27 anos no último dia 7 de Outubro:

“Era uma noite de quinta. Seis de outubro de 1981. Não sei porquê tinha passado o dia no Tivoli Parque da Lagoa com mais duas amigas. Não era um aniversário. Não era um dia especial. Muito menos feriado. Apenas passamos a tarde brincando. Trem-Fantasma, Montanha Russa, Carinho Bate-Bate, Conga – a mulher Gorila. Voltamos exaustas para a minha casa. Presente de mãe: colchões no chão e noite do pijama com as amigas.

Assim que entramos pela porta, meus pais estavam saindo. Iam para o hospital. Minha mãe sentia dores. Já eram as dores do parto. Ainda não sabíamos. Uma agonia tomou conta de mim. Eu queria mandar minhas amigas embora, queria grudar na minha mãe. Porém, era melhor não, foi o que pensaram.

Tentei dormir, virei prum lado, pro outro. Vencida pelo sono e pelo dia no parque, adormeci.

Acordei com meu pai me chamando. Não me lembro a hora exata, mas o dia estava amanhecendo. Na mão, um cartão com um pézinho carimbado. “Seu irmão nasceu”, ele me disse. Ali, naquele intante, o mundo parou. Tudo ganhou cor. Tons que eu nunca tinha visto. A minha vida ganhou sentido. Meu “eu” fazia sentido.

Não me recordo de tê-lo visto no hospital. Sei que fui, mas não lembro. Sei que fiquei grudada nele todo o tempo desde o momento que chegou em casa. Eu nunca ganhara nada tão especial. Um ser cor de rosa, de cabelos louros e olhos tremendamente azuis. Passei meses completamente fora do ar. Era tanta felicidade que mal conseguia pronunciar: “eu tenho um irmão!”.

Eu nasci solitária. Sempre me senti muito só. A solidão brotou comigo, pisoteando meu peito, me assolando a garganta. Implorava, diariamente, a minha mãe que me desse um irmão. Não aguentava ser única. A filha única. Ser uma me dóia na alma. Me sufocava. Eu chorava de tristeza. Mesmo cercada de primos, alguns bons amigos, eu queria um outro. Um outro “meio eu”. Eu queria dividir, somar, multiplicar e dividir. Não na tabuada da escola, mas nas contas da vida.

Ontem, sete de outubro, ele fez aniversário. Hoje em dia é homem feito. Sociólogo. Preocupado com o mundo e com os outros. Sempre foi assim. Ganhava um brinquedo e dava, imediatamente, a qualquer outro amigo que gostasse do mesmo. Minhas avós arrancavam os cabelos. Por ordem delas, tínhamos que ir, de casa em casa da rua, recolhendo os brinquedos “dados” por ele. Aos 14 anos, fez meu pai pagar os estudos de um amigo, já que o pai dele não tinha mais condições de arcar com os estudos dos filhos. O menino era ótimo aluno, não poderia ficar sem estudar. Papai acatou a idéia. Hoje, é rapaz formado em Economia pela UFRJ.

A casa era lotada de amigos. Ele sempre foi de falar. Eu sempre fui do silêncio. Ele é da rua. Eu sou de casa. Ele é dos esportes. Eu sou das letras. Ele é diplomata. Sabe remediar. Eu sou do combate. Sei guerrear. Ele é ansioso. Eu sou serena. Ele é verde. Eu sou azul. Ele é paixão. Eu sou amor. Ele fala sobre o social. Eu penso no humano. Ele é de Libra. Eu sou de Áries. Dizem os entendidos que um é o complemento do outro.

Os olhos dele ainda são azuis. O cabelo escureceu. Dividimos coisas que só nós sabemos. Muitas vezes, ter irmão não era como eu imaginava. Brigamos, discordamos, nos afastamos. Fizemos as pazes. Há anos, nos entregamos. Paramos para ver que o que construímos é tão raro e tão bonito que tudo e qualquer coisa é pequeno. Fica menor.

São anos de alegria. Somente por ele existir. Meu desespero é olhar para o lado e não vê-lo. Caço com desespero. Trago ele sempre junto. Me desdobro para acolhê-lo. Para dar-lhe o que a vida tira. Para ouvi-lo e abraçá-lo. Sou feliz por tê-lo.”

é isso, por fernando stickel [ 17:49 ]

3 comentários

Mariana

novembro 17th, 2008 at 20:47

Oiê!
Super bacana da sua parte!
Já até liguei pro Gui pra ele ver!
super beijo!

Márcia Vianna

novembro 17th, 2008 at 23:45

Aiiiiiii, que inveja! No bom sentido, se é que seja possível. Sou filha única, já “veinha” e não tive a sorte de ter um irmão (nem irmã).
Embora a vida tenha sido sempre muito generosa comigo, sempre sinto uma invejinha de quem tem irmão e se dá bem com ele…
Também queeeeeeeeeeeeero!

madoka otsuka

novembro 19th, 2008 at 7:28

Linda carta…me emocionei, que sensibilidade da moça, do pai dela, e do irmão…lindo demais. Ler isso, é um bálsamo nos dias que correm…
Quem são os protagonistas heim…(curiosidade hehehehehehe), adorei mesmo!!!
bjs e sayonara
madoka

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